Depois de 41 anos de
confinamento, Herman Wallace foi libertado na semana passada. Três dias depois,
ele morreu de complicações de câncer de fígado enquanto dormia.
Wallace, 71 anos, um dos
“Três de Angola”, foi condenado em 1972 pelo assassinato de um guarda da
Penitenciária do Estado de Louisiana, também conhecida como Angola. Até o fim,
defendeu sua inocência. Em 1º de outubro, um juiz federal declarou que seu
julgamento não foi justo e retirou a acusação do júri de instrução.
Prisioneiros que viveram
em silêncio absoluto relatam ter tido alucinações e a sensação de que estavam
loucos. Por quê?
DCI
Independentemente da
política do caso, a morte de Wallace mostra que anos de isolamento têm um
efeito profundo sobre o corpo e a mente.
“Entendo que ele tenha
perdido mais de 18 quilos nos meses anteriores ao diagnóstico do câncer de
fígado, quando se descobriu que seu caso era incurável. Mas com a assistência
médica adequada, teria sido diagnosticado muito mais cedo, tratado intensamente
e provavelmente a doença não o mataria tão rápido”, sugere o dr. Terry Kupers,
psiquiatra do Instituto Wright, com formação em psicoterapia psicanalítica e
forense e psiquiatria social e comunutária.
Os efeitos físicos mais
comuns da doença incluem problemas cardiovasculares e gastrointestinais,
enxaquecas e fadiga profunda. Enquanto estava no confinamento solitário,
Wallace provavelmente se saiu melhor do que a maioria dos prisioneiros
isolados, segundo especialistas, devido à sua consciência política.
“Sempre me impressiona o
fato de que muitos desses detentos não guardam tanto rancor por sua situação”,
diz Kupers. “Creio que isso é especialmente verdadeiro em relação aos presos
muito inteligentes e politicamente sofisticados, como Herman Wallace”.
“Discuti essa questão com
Robert King (um dos Três de Angola, hoje em liberdade), que concorda comigo
nesse ponto. Quando os presos compreendem a dinâmica social e a injustiça de
seu tratamento na prisão, eles não sentem tanta raiva como os que decidem
sobreviver para mudar um sistema tão abusivo e discriminatório. Isso deve
explicar por que alguém como Herman Wallace conseguiu sobreviver por quase 42
anos de tortura em confinamento solitário e continuar lúcido, politicamente
consciente e comprometido com a justiça”.
Stuart Grassian, psiquiatra
que estuda o confinamento solitário, visitou os Três de Angola no início de
2000, em Angola. ”As condições lá eram particularmente abomináveis”,
relata. “Estive em muitas prisões e nunca senti medo, exceto lá. O Acampamento
J (uma área de Angola reservada ao confinamento solitário) é uma masmorra
miserável, com celas minúsculas e sujas, vazamento de água, mofo e absurdamente
quentes no verão. Os mosquitos são insuportáveis. Mas esses homens possuíam uma
enorme força e inteligência, e nunca sucumbiram aos sintomas mais drásticos do
isolamento”.
Uma das condições
associadas ao confinamento, raramente observado na população em geral, é o
chamado delírio psicótico florido. Os sintomas incluem hiperreação a ruídos e
outros estímulos, alucinações, ataques de pânico, dificuldade de concentração e
de memória e paranoia.
Estudos que utilizam a
eletroencefalografia (EEG) para medir as reações do cérebro a estímulos mostram
que, após poucos dias de confinamento solitário, aumentam o estupor e os
delírios. Um desses estudos comprovou que os sintomas podem se prolongar após a
libertação do confinamento. Com o tempo, segundo Kuepers, ocorre um
entorpecimento generalizado.
“Descobri que os
prisioneiros que passaram décadas em confinamento solitário desistem de se
comunicar. Eles não falam sequer com o guarda que entrega a bandeja de comida
ou dizem bom dia ao detento da cela ao lado”, relata Kupers .
“Para dominar a raiva, eles
começam a suprimir todos os sentimentos e a se sentir entorpecidos, sem vida e,
finalmente, ‘mortos’. Um grande número de presidiários descreveu essa sensação
de isolamento e entorpecimento, mesmo no contexto do confinamento solitário,
como um estado de morte”.
Metade dos suicídios bem
sucedidos nas prisões dos Estados Unidos é cometida por detentos em
confinamento solitário, informa Kupers – cerca de 4% a 6% da população
carcerária.
O principal investigador
de práticas de tortura das Nações Unidas, Juan Mendez, pediu que os Estados
Unidos banissem o isolamento prolongado, citando suas consequências nefastas
para o corpo e a mente.
Os apoiadores de Wallace
esperam que seu caso inspire mudanças no sistema penal. ”Herman nunca foi
o foco”, declarou uma amiga, Ashley Wennerstrom, ao NOLA.com . “Trata-se de um
movimento muito maior para tornar o sistema de justiça criminal, de fato,
justo”.
Fonte:
Discovery noticias
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